De acordo com estatísticas do Banco Mundial, o Brasil está entre os países da América Latina que mais realizaram progressos na expectativa de vida de sua população: entre 1970 e 2010, a expectativa aumentou em 30 anos. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) avança ainda mais nessa conclusão e aponta que, até 2060, a população acima de 65 anos vai quadruplicar no País, indo de 14,9 milhões de pessoas (7,4% do total de brasileiros), em 2013, para 58,4 milhões (26,7% do total), em 2060. A estimativa faz parte de uma série de projeções populacionais baseadas no Censo de 2010 divulgadas no dia 17 de outubro pelo IBGE.
Além da ampla experiência de vida adquirida com o passar dos anos, o envelhecimento também pode trazer algumas consequências provocadas pela natural mudança fisiológica do organismo. A principal delas afeta a harmonia entre fatores primordiais para o envelhecimento saudável – comunicação, humor, mobilidade e cognição, entendida como a capacidade de compreender e resolver problemas cotidianos. Com o objetivo de oferecer práticas que melhorem a harmonia entre esses fatores, o Departamento de Gerontologia (DGero) da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) oferece a "Oficina de Memória para Idosos", atendendo um grupo de 30 participantes.
Keika Inouye, docente do DGero e coordenadora da atividade, explica que a oficina foi divulgada pela imprensa e os idosos interessados entraram em contato com o Departamento. Todos eles foram visitados em suas residências para avaliação da equipe do projeto de extensão, que se baseou em critérios relacionados à atividade proposta, como faixa etária a partir de 65 anos, não ter problemas de depressão e de demência e ter autonomia. Após a triagem, os 30 idosos selecionados iniciaram a oficina em setembro deste ano.
Durante as oficinas, com duração de duas horas cada, as práticas promovidas envolvem atividades que enfatizam memória de curto e longo prazos; cálculo; fluência verbal; dupla-tarefa, em que se executam duas tarefas concomitantemente para exercitar o cérebro; capacidade viso-construtiva, que trata da habilidade de construir objetos no espaço; raciocínio lógico; e atenção visual e auditiva. Em cada encontro são tratados temas diferentes que são explicados antes das atividades, por meio de uma curta palestra oferecida aos participantes. "Se vamos tratar naquele dia sobre memória de curto prazo, apresentamos rapidamente o que é memória e como ela se constitui, para que os idosos tenham uma contextualização da prática do dia", relata a coordenadora da oficina.
Nas oficinas, são oferecidos jogos, práticas pedagógicas com peças em madeira e outras que estimulam a memória, ações simples como falar expressões de um certo grupo de palavras, além de exercícios físicos que buscam movimentar o corpo, atividades motoras de repetição, dentre outras. De acordo com Inouye, a dupla-tarefa é bastante eficaz e estimula vários sentidos nos idosos. "Nesses casos, eles devem andar em linha reta e, ao mesmo tempo, falar nomes de mulher com uma determinada letra, por exemplo, e trocar moedas de um bolso para outro. É interessante que no começo eles têm dificuldade, mas depois conseguem fazer a sequência com mais facilidade", relata a docente.
A coordenadora ressalta a importância da inserção da atividade física nos trabalhos da oficina, reconhecendo que a união entre estímulos de memória e cognição e exercícios físicos pode propiciar uma melhora ainda maior nas conexões cerebrais dos participantes. "A maioria dos estudos e trabalhos com atividades de estimulação cognitiva acabam tendo ênfase nas atividades em si. Nós esperamos que, unindo isto à atividade física, tenhamos uma melhora a mais. Na verdade, alguns trabalhos na área de Fisiologia já mostram que a atividade física ajuda a estimular a memória", conta Inouye.
Para os participantes da atividade, os benefícios têm sido percebidos no dia a dia. "A oficina ajuda bastante porque eu ficava muito em casa parada. Agora consigo abrir mais minha mente, me movimentar", comenta Maria de Lourdes do Santos, de 63 anos. Helena Araújo, de 77 anos, relata que o contato com novas pessoas a ajudou até na relação familiar. "Eu me sinto melhor agora até para brincar com meu neto; faço com ele algumas das atividades que fazemos na oficina e a gente se diverte", comemora. Para Carlos Vitor, de 60 anos, além dos benefícios sociais da oficina, o ganho maior está no conhecimento. "Aqui a gente tem esclarecimento e aprende mais sobre a limitação natural que o envelhecimento traz. As palestras nos ensinam muito a conhecer as limitações que a idade nos impõe, e o carinho das meninas (professoras e monitoras da atividade) é muito bacana", afirma.
Keika Inouye comenta que o importante é promover sempre práticas que possam manter e aumentar as conexões cerebrais nos idosos, garantindo atividade neurológica que, por consequência, pode evitar a instalação de quadros de demência, como o Alzheimer, por exemplo, e problemas como depressão e isolamento social. A professora relata que estudos atuais têm demonstrado que atividades que estimulam a memória (armazenamento de informações); a função executiva (planejamento, antecipação e sequenciamento de tarefas complexas); linguagem oral e escrita; praxia (execução de um ato motor); gnosia (reconhecimento de estímulos visuais, auditivos e táteis); e a função tempo-espacial (localização no tempo e espaço) proporcionam melhoria das conexões cerebrais. "Quanto mais usamos o cérebro, mais ele faz conexões. É isso que queremos preservar por meio da oficina", esclarece a coordenadora.
O planejamento para o grupo é de oito encontros e o término está previsto para novembro. A expectativa é que os participantes tenham melhora em relação à avaliação à qual foram submetidos no início da atividade. "Nós fizemos uma avaliação da cognição, da qualidade de vida e da sabedoria desses idosos por meio de instrumentos específicos, e nossa intenção é que essas variáveis tenham uma melhora", relata Inouye. Ela também avalia que outro objetivo da oficina é fazer com que os idosos fiquem estimulados a procurarem outras atividades que mantenham sempre o cérebro ativo. No dia a dia, a docente recomenda que esse público pratique atividades físicas, participe de grupos sociais e mantenha práticas que são prazerosas, como costurar, fazer palavras-cruzadas, assistir filmes, cozinhar e viajar, por exemplo.
A Oficina de Memória promovida pela UFSCar conta com a participação de docentes do Departamento de Gerontologia da Universidade e a contribuição de educadores físicos da Unesp de Rio Claro, bem como de um graduando de Fisioterapia da Unicep. Após a avaliação final desse grupo que está em andamento, a coordenação da atividade fará estudos para propor novos grupos a partir do próximo ano.
Divulgação científica
Dentro da programação da Semana Nacional de Ciência e Tecnologia 2013, que acontece entre os dias 21 e 27 de outubro em todo o País com o tema "Ciência, Saúde e Esporte", a Oficina de Memória da UFSCar será apresentada na palestra "Memória e Envelhecimento", que acontece no dia 22 de outubro, às 9 horas, no Centro de Divulgação Científica e Cultural (CDCC) da USP, localizado na rua Nove de Julho, 1.227, no Centro de São Carlos. O evento será ministrado pelas professoras Keika Inouye e Sofia Pavarini, ambas do DGero, e é aberto a todos os interessados.
Em São Carlos, parceria entre a UFSCar, o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo – Campus São Carlos (IFSP) e o Centro de Divulgação Científica e Cultural (CDCC) da Universidade de São Paulo resultou em uma programação diversificada para a Semana, com palestras, demonstrações, mostras de trabalhos e oficinas, dentre outras atividades. Também há programação prevista para os campi Araras e Sorocaba. A programação completa pode ser conferida em www.snct2013.ufscar.br.
A Semana Nacional de Ciência e Tecnologia acontece em todo o Brasil, em uma promoção da Secretaria de Ciência e Tecnologia para Inclusão Social do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. O objetivo é a divulgação, difusão e apropriação social de conhecimentos científicos e tecnológicos. O tema "Ciência, Saúde e Esporte" foi escolhido para a edição deste ano visando aproveitar os grandes eventos esportivos mundiais a serem realizados no Brasil nos próximos anos para motivar a população e, em especial, crianças e jovens, a conhecerem os aspectos científicos, educacionais e de Saúde envolvidos nas atividades esportivas.